segunda-feira, 1 de abril de 2013

Hitchcock: o homem que criava demais

Flávia Lopes


O conceito de criatividade não possui consenso para a psicologia. Mas é comum a concepção de que o processo criativo está relacionado à inovação. A criatividade é expressa em diversas formas de manifestações humanas e é considerada uma característica fundamental para construção de obras de arte em suas várias formas como: a música, as artes plásticas, o cinema etc. Mas, um dos pontos que parecem ser comuns à maioria das teorias é o fato de que a criatividade está relacionada à inovação.

Seguindo os preceitos de criatividade abordados na psicologia, uma pessoa que inova em qualquer meio, revelando características únicas, pode ser considerada uma pessoa criativa. O diretor de cinema Alfred Hitchcock se enquadra nesse conceito, e desde o início de sua carreira contribuiu para o mundo do cinema com a sua criatividade. Até hoje, vários outros diretores de cinema reproduzem técnicas dele em seus filmes. Sua extensa filmografia criou parâmetros para delimitar o suspense e seus desdobramentos no mundo do cinema.

Alfred Joseph Hitchcock inovou e deixou seu estilo próprio cravado na sétima arte. Suas obras mostraram o suspense de uma nova forma. Os enredos eram carregados de tensão, batidas musicais marcantes, violência, sangue. Em seus filmes o suspense é psicológico e tudo fica subentendido, os mocinhos não são sempre mocinhos e os vilões são reveladores. A fotografia, ora sombria, ora vibrante, ora opaca, também era inovadora e se enquadrava com o contexto das histórias.

Seu suspense era característico. Hitchcock trouxe novas técnicas no posicionamento e movimento das câmeras, nas elaboradas edições e nas surpreendentes trilhas sonoras que realçam os efeitos de suspense e terror. Em seus filmes são valorizados o uso de música forte e dos efeitos de luz.

· O desvio de funções em papéis de personagens que é um dos recursos de suspense mais utilizados por ele. Mocinhas morrendo no início da trama (Psicose, 1960 e Um corpo de cai, 1958), heroínas de caráter duvidoso (Marnie – Confissões de uma ladra, 1964) e vilões que na verdade são inocentes e mocinhos que ao final se revelam vilões (Disque M para matar, 1954 e O homem que sabia demais, 1956) são recursos que marcam os filmes do diretor;

· MacGuffin: técnica usada elo cineasta para definir um objeto que serve de pretexto para avançar a história sem que ele tenha muita importância no conteúdo da mesma. Por exemplo, O MacGuffin de Psicose (1960) é o dinheiro roubado do patrão. O montante levado só serve para conduzir a personagem Marion Crane até o Motel Bates; mas, quando a secretária chegar ao motel, o dinheiro perde a importância no desenrolar da história.

· Dolly effect: Um dos efeitos de fotografia em cinema mais interessantes criados na década de 50 foi aprimorado por Hitchcock e seu operador de câmera Irmin Roberts. O efeito consiste no afastamento da câmera por trilhos ou força motora ao mesmo tempo em que o fotógrafo amplia o zoom. Impressa no negativo estará uma espécie de “vertigem”, sentida através dos movimentos antagônicos e sincronizados de afastamento e aproximação da câmera. A técnica veio bem a calhar para o personagem Scottie (interpretado por James Stweart), do filme Vertigo, que sofre de acrofobia e sente tonturas ao entrar em contato com grandes alturas.


Criatividade em Hitchcock


Hitchcock era considerado uma pessoa excêntrica e única. Essas características consequentemente convergiam para as suas obras. O diretor é conhecido por dirigir filmes de suspense e de terror e em entrevista revelou que retratar essa temática é uma forma de superar seus medos (Truffalt, 2004).

A produção de filmes para Hitchcock era uma forma de refúgio. Esse tipo de criatividade se enquadra na concepção freudiana ortodoxa que traz a ideia de que a criação do homem é uma espécie de necessidade fundamental como dormir e comer, com o objetivo de aliviar tensões. De acordo com Freud, para resolver problemas o indivíduo pensa criativamente visando obter algum retorno ao estado de equilíbrio perturbado por um conflito. A criatividade torna-se um meio de reduzir a tensão.

Para Freud, a criatividade é originada em um conflito dentro do inconsciente (id). Mais cedo ou mais tarde, o id produz uma solução para esse conflito. Caso tal solução reforce a atividade pretendida, é encarada como criatividade. Caso contrário, se houver repressão do alívio dessa tensão se transformará em neurose. Segundo Freud, as produções artísticas e os atos criativos na vida adulta seriam substitutos do brincar infantil, a criatividade estaria relacionada com a busca da realização de desejos e também possibilitariam uma proteção (defesa) contra o sofrimento.

A inclinação de Hitchcock para o susto vem desde a infância. Em declarações exibidas no programa The Dick Cavett Show, ele afirmou que quando pequeno sua mãe gostava de lhe dar pequenos sustos e isso lhe provocava soluços. Não se pode afirmar, porém, que o fato de produzir filmes de terror e suspense advém de traumas da infância, mas o fato é que ele mesmo afirmou produzir esse tipo de filme para poder superar seus medos.

Freud explica que a criatividade está relacionada à imaginação, que estaria presente nas brincadeiras e nos jogos da infância. Nessas ocasiões, a criança produz um mundo imaginário, com o qual interage rearranjando os componentes desse mundo de novas maneiras. Da mesma forma, o indivíduo criativo na vida adulta comporta-se de maneira semelhante, fantasiando sobre um mundo imaginário, que, porém, discrimina da realidade. Hitchcock canalizou sua criatividade para o cinema.




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